2019: A saga da Autoridade

Memória do Observatório: Episódio 4/5

Após a aprovação da LGPD, 2019 viu a discussão se voltar para a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, cujo formato proposto pela MP 869/18 não trazia a autonomia e independência de atuação desejada por todos os atores envolvidos na discussão da Lei.

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Depois do ânimo criado com a aprovação da LGPD em 2018, 2019 trouxe a perspectiva de avaliar a MP 869 e tentar reverter a definição da Autoridade Nacional, tornando-a independente.

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No dia 27 de março, o deputado federal Orlando Silva é novamente designado relator da matéria, desta vez na Comissão Mista criada para dar um parecer sobre a Medida Provisória num prazo de, no máximo, 45 dias, sob o risco de travar a pauta da Câmara.

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Dentro de um Congresso com uma renovação recorde de parlamentares, o equilíbrio de forças pendeu para o setor privado e a aliança entre as partes interessadas vista durante a discussão da LGPD não se repetiu.

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Ainda assim, havia consenso sobre a necessidade de uma Autoridade mais forte. A solução foi alterar o texto para dotar a Autoridade Nacional de Proteção de Dados de uma natureza transitória: a princípio vinculada à Presidência, como proposto por Temer, com possibilidade de tornar-se uma autarquia dois anos após sua criação. 

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No dia 7 de maio, a Comissão Mista aprova o relatório de Orlando Silva sobre a MP com algumas mudanças no texto de Michel Temer. No dia 29 do mesmo mês, foi a vez do Senado aprovar o relatório de Orlando, que seguiu para sanção do presidente Jair Bolsonaro.

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Bolsonaro sanciona a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados na Lei 13.853 no dia 9 de julho. No entanto, o presidente fez veta nove itens incluídos pelos parlamentares na MP, como determinados tipos de sanção e a revisão por pessoa natural de decisões automatizadas.

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No dia 25 de setembro, o Congresso derruba os vetos de Bolsonaro relacionados a três tipos de sanções: suspensão parcial do funcionamento do banco de dados por até seis meses; suspensão do exercício da atividade de tratamento dos dados pessoais pelo mesmo período; e proibição parcial ou total do exercício de atividades relacionadas a tratamento de dados.

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Por conta de um voto, o veto à revisão natural de decisões automatizadas é mantido. No Senado, foram 40 votos a 15 pela derrubada do veto – que já havia sido aprovada na Câmara. O mínimo necessário eram 41 votos.

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Depois do afastamento ao longo das discussões da MP da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, setor privado e academia e sociedade civil se reaproximam em torna de defesa da escolha dos diretores da Autoridade a partir de critérios técnicos.

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Além da demora por parte do governo Bolsonaro em fazer a indicação dos diretores e de fato criar a Autoridade, há um temor que os diretores escolhidos não estejam qualificados para enfrentar os desafios postos à frente do órgão.

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Isto porque a Autoridade Nacional de Proteção de Dados ainda precisa regulamentar diversos pontos da LGPD antes que ela entre em vigor, em agosto de 2020. Para completar, também é papel da ANPD trabalhar em dispositivos infralegais para encorpar a normatização do tema.

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 Frente a esse cenário, há uma grande expectativa para assistir como a LGPD será ‘’posta em prática’’ pela Autoridade. Sem uma ANPD como guia, existe o medo da maneira como o texto será interpretado.

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De qualquer forma, o avanço na proteção dos dados pessoais dentro do Brasil é irreversível. O maior exemplo disso é a PEC que tramita no Congresso e inclui essa proteção entre os direitos fundamentais dos brasileiros expressos na Constituição. 

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Após o fim do processo legislativo da Lei Geral de Proteção de Dados, o consenso entre as partes envolvidas é que o texto final obtido era o melhor possível dadas as diversas expectativas divergentes envolvidas.

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Esse arranjo inesperado conseguiu transformar um projeto originário de um governo petista em um esforço suprapartidário é um exemplo cristalino do processo democrático.